domingo, 15 de setembro de 2013

A gostosa da esteira


Você tá lá - só você mesma com a esteira - pensando na vida, parecendo uma criancinha íntima de um brinquedinho informal. Ora aperta o tal do botão de acelerar, ora aperta o botão de desacelerar. Aí, do nada, entra " A"  gostosa. Aquele tipo do moça que parece que nasceu o contrário de você - bunda pra fora e barriga pra dentro. Então " A"  gostosa começa a correr na esteira ao lado. Pronto! O Universo começa a entrar em conflito. Sua paz interior acaba. Você pensa até na guerra da Síria. Na paraolimpíada de 2016... E a gostosa tá lá do seu lado, correndo com a mesma facilidade que você come um brigadeiro.

Então você olha praquela bunda e uma espécie de depressão pós-glúten toma conta do seu ser. A partir daí você invoca qualquer força metafísica que esteja ociosa e disposta a ajudar na sua bundificação espiritual. Enquanto aperta freneticamente o botão de acelerar, você começa a pensar naquele ex-parente escroto, no chefe vagabundo, nas pessoas que ligam domingo de manhã. Agora a raiva toma conta. E quando se dá conta você tá correndo. Enquanto corre, pensamentos estranhos começam a surgir na sua mente: " Ok! Estou correndo feito um hamster pra manter a saúde" , " Esse sacrifício aqui vai me dar mais disposição pros afazeres do dia a dia" , " Será que um dia meu corpo vai se parecer com a maquete do corpo da gostosona aí?" ...Quando, de repente, aquela espécie de câimbra dolorida começa a apertar seu estômago e tudo começa a perder o sentido. Parece que tão enfiando com muita maldade os dedos nos seus pulmões.

Com muita dor, parecendo uma claustrofóbica presa num caixão de anão, dá uma olhadinha pro lado e se dá conta que a gostosa continua  tão firme quanto as coxas que ela usa pra correr. " Algum físico quântico pode explicar isso, a mulher corre igual um puma e nada dela mexe do lugar?" . Você olha pro relógio da esteira e só se passou cinco minutos. Cinco minutos. Cinco! Agora você entra naquela fase em que começa a planejar quantos grãos de arroz vai precisar tirar pra não sofrer tanto assim. Começa a se despedir dos chocolates, das pizzas, da sua vó cozinheira-mágica. Até que, quando tá quase desmaiando, vê a gostosa dar ¨tchau¨ prum conhecido dela - tudo isso sem parar de correr, claro. Viva! Você aperta o botão STOP da esteira e, meio cambaleando, quase chora de tanto alívio. Finalmente você reconhece que o seu "tchau" é muito mais charmoso do que o da gostosa. Muito mais caloroso. É quase um "até breve", pois tem o gingado de um sambista - que balança com graça pra lá e pra cá.